Ivan Flecha
Folha em Branco
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4 min readNov 8, 2022

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UMA COISA RUIM QUE EU TENHO PRA TE CONTAR

Não vai ficar tudo bem; Se você está já há algum tempo esperando as coisas ficarem ‘tudo bem’; esperando a sensação de estar errada passar, a coisa ruim que eu tenho pra te contar é essa; O buraco, o bloqueio e a tortuosidade não vão passar; Não vai passar a sua ânsia, nem as suas gulas, nem o descontrole.

Aquela segunda-feira que uma boa notícia te trouxe a sensação de dever cumprido não vai voltar; aquela memória de quando seu tique nervoso parou não vai vir pra ficar, será só eternamente um breve espaço de duas horas naquela sétima série, noite ou tentativa.

O que eu espero que você sinta que estou fazendo por ti com estas palavras é delinear um monstro. Sim, é um monstro esse buraco dentro de nós; Eu, Você, ela, eles… Nós somos aqueles afligidos pela incerteza de tudo, pela catástrofe disfarçada através de cada escolha. Existe um motivo pra isso: nossos princípios são frágeis, não se fixam na memória, fomos pessoas de momento, vivendo por impulsos, não conseguimos consolidar preferências, julgamentos, valores. Pra sempre estaremos sob a espada da tentação.

Esse monstro tem uma forma bem simples: você não sabe como se conduzir aos mesmos lugares novamente. Você não tem um domínio claro, uma receita de atitudes e falas, que traga consistência para sua existência.

E as pessoas amam isso em você. Você explode. Você verte. Você preenche a vida deles com uma emoção sem igual.

E as pessoas odeiam isso em você. Você implode, derrama, descumpre expectativas. Mesmo quando você já aprendeu a respeitar, a avisar, a não desaparecer, a alinhar e a comunicar. Você continua descumprindo. Você segue sendo, não-o-bastante.

A faca da decepção alheia vem te cortar, todo dia, toda hora acordada.

Isso não vai passar.

Não é uma regra, uma lei do universo, mas as probabilidades dizem que para 99% de nós isso não vai passar. Vamos fazer 20, 30, 40, 60 tentando nos tornar sólidos, confiáveis, previsíveis.

Eu quero que você entenda agora que é melhor você tirar essa idéia da sua mente, que a felicidade não depende dela e que você simplesmente vai ter que lidar com esse buraco. Com essa solidão. E sim, tudo vai doer muito mais em você. Porque seus dias de dor são sempre o pior dos dias. Porque você tem esse demônio pra quem é preciso estar constantemente cantando um ninar. É melhor você aceitar que não vai ter esse local de paz e equilíbrio.

Você não precisa disso. Está aqui. Chegou até aqui. O que você precisa é aprender a conviver com quem você é. Aquele ponto distante onde o nó na sua alma ficou dado e ninguém te enxergou e ele foi travando cada vez mais pontos na corda está longe demais pra alcançarmos agora.

Ele está nos seus seis anos, naquela conversa com sua professora. Está nos seus sete anos, naquele copo d’água que seu pai jogou na sua cara. Nos seus 12 anos, naquela mentira que sua colega de classe contou sobre você pra turma toda. Nos seus 15 anos, naquele filme que você aceitou viver como coadjuvante, o filme da sua vida inteira, em que outra pessoa era o herói, e você somente segurava os pratos. Você somente emprestava a casa onde todos iam brincar. A glória era de outrem, mais líder que você, mais líder de você que si próprio.

Você se deixou colocar em segundo plano. Agora não tem mais volta. O que temos é a estrada adiante e como você vai fazer pra cuidar bem de si mesmo, como você vai gastar seus dias pra melhorar cada vez mais quem você é.

Você é o que vale, você é o ticket, o espetáculo e a saída pra casa com gosto de pipoca na boca e calor no coração.

A única coisa que você precisa fazer é continuar se tornando uma pessoa cada vez mais interessante, cada vez mais dona da sua história, e boa oradora na hora de contá-la.

O seu conto irá embalar todos a sua volta, e colocar o monstro pra ninar.

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