Meu primeiro mochilão

Gabriel Guandalini
Folha em Branco
Published in
6 min readSep 17, 2014

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Mochila nas costas, pé na estrada e aventura no coração. É assim que muita gente gostaria de viajar. É atrás desse romantismo em descobrir o mundo, aliado a um tipo de viagem independente, livre, divertida e mais barata, que muitas pessoas se deixam seduzir pelo famoso mochilão.

Quem não quer conhecer um lugar desses?

Sempre foi um grande sonho meu viajar pelo mundo afora. Fazer isso com uma mochila maneira nas costas e espírito livre para seguir por aí em busca de aventura, ainda mais economizando dinheiro, pareceu a solução perfeita para realizar esse anseio. Realizar um mochilão era um desejo muito grande que eu cheguei a transformar em planos diversas vezes, mesmo que nunca colocados em prática. A ideia nunca conseguia render mais do que roteiros quase absurdos e leitura de toneladas de guias de viagem espalhados pela internet. No final das contas, todo o esforço virava um suspiro que traduzia: “um dia vai dar pra fazer”. Depois de repetir esse ritual diversas vezes, esse dia finalmente chegou.

Vindo morar na Europa, talvez o destino turístico mais ambicionado de todo o mundo, era quase óbvio que não tardaria para que o sonho enfim se concretizasse. A verdade é que estava tão ansioso por viajar pelo Velho Continente que já estava com planos prontos antes mesmo que eu deixasse o território tupiniquim. Não completaram 10 dias para que eu comprasse uma mochila (ignorando, é claro, todas aquelas dicas de como comprar uma boa mochila lidas na internet), pegasse um amigo com um sonho semelhante e partisse para o aeroporto para mochilar.

Mochilas, boné e um pouco de coragem: tudo que é preciso para começar

Sempre soube que esse tipo de viagem teria certos desafios, afinal são praticamente intrínsecos ao estilo de mochilar e dão o charme de aventura da coisa, mas acreditei que havia feito escolhas que os evitariam ao máximo. Um destino estruturado e bem organizado para receber turistas como as capitais européias não parecia um terreno inóspito que me traria dores de cabeça, muito menos quando havia reservas feitas para hospedagem em todos os destinos e todas as passagens, de trem e de avião, estavam compradas com antecedência. Os doze dias de viagem davam tempo para explorar cada cidade com a calma merecida e nem iam exigir muitos malabarismos com as roupas, afinal dava para caber tudo na mochila. E dinheiro? Bem, essa parte ia ser um pouco apertada, mas tinha gente que já havia feito muito mais com muito menos. Tudo apontava para algo simples, que no máximo traria calos nos pés e queimaduras de sol.

Não foi bem assim. De dormir no chão do aeroporto debaixo de uma escada rolante a ficar hospedado em um albergue que parecia concentrar criminosos de pouco renome de Paris, passando por ficar encharcado de chuva sem muda de roupa ou então correr para alcançar um trem, enfrentei minha cota de problemas e tive momentos de arrepiar os cabelos da nuca. Confesso que em mais de uma ocasião me passou pela cabeça trocar as passagens e voltar para casa mais cedo, ora por exaustão completa e ora por temor do dinheiro faltar.

Na foto até tem sorriso, mas dormir naquele hall gelado e barulhento do aeroporto não foi nada de se alegrar

Imagina passar doze dias comendo só Mc Donalds. Não por vontade, mas porque era a única coisa que dava pra comprar. E nem podia ser promoção do Big Mac.

A conclusão que cheguei depois dessas situações é que toda viagem é um desafio. Este pode ser maior ou menor, dependendo das circunstâncias e, principalmente, do quanto dinheiro se tem à disposição, mas ele sempre existe. Viajar implica em sair da sua zona de conforto e enfrentar o desconhecido. Mesmo que estejamos partindo para um destino que julgamos familiar, sempre haverá algo diferente do que estamos habituados. Ao mesmo tempo que isso possa gerar certos obstáculos, essa quebra da rotina e a necessidade de se reinventar é um dos maiores atrativos em uma viagem. É quase eufórico a sensação de desbravar o estranho e então dominá-lo.
Essas pequenas dificuldades serviram para dar ainda mais gosto à viagem e fazem parte das coisas que dou risada de ter passado. Mas mesmo durante toda a jornada, todas essas preocupações e perrengues, mesmo que muitos, nunca impediram de aproveitar cada momento. Qualquer angústia acabava sufocada pelo deleite de estar fazendo aquilo que antecipara em pensamento durante anos e anos.

É ótimo finalmente ter a oportunidade de tirar aquela foto clichê que você sempre sonhou

Assim, lá fui eu, atrás de novas experiências, trilhando aos poucos o sonho de ter passado por todos aqueles lugares que lia a respeito. A cada nova parada, crescia o êxtase por visitar locais famosos por todo o mundo ou então por conhecer cenários belíssimos. A emoção de fazer aquela viagem me dominava a todo momento. A Europa ainda garante uma alegria a mais por permitir perambular pelas mesmas ruas que milhares de figuras históricas de séculos e séculos atrás, dando combustível inesgotável para a imaginação trabalhar e resgatar como teria sido tudo aquilo no passado.

O Salão dos Espelhos em Versailles é só um dos muitos lugares que transbordam história pelos quais passei

Mesmo que o tempo disponível não fosse dos maiores e os grandes cartões postais fossem a orientação básica para os roteiros diários, fiz o possível para ser um bom viajante e conhecer ao máximo a verdadeira vida e cultura de cada um dos locais por onde passei. Partilhar dos pensamentos e vivências diários dos cidadãos de cada um dos países visitados e ao mesmo tempo visitar tudo que gostaria não foi tarefa fácil, deixando a certeza que ainda terei muito a explorar e que sempre será necessário retornar para vivenciar mais e mais. A missão de ser cada vez menos um gringo e cada vez mais um nativo em potencial continua.

O tamanho da barba e cara de cansaço já entregam que esse era o último dia de viagem

O sapato que era novinho voltou com a sola toda gasta e cheio de aventura pra contar. Mas ele ainda tem muito chão pra pisar e pode apostar que ele vai.

Para concluir, posso afirmar que esse mochilão de estreia foi fantástico. Permitiu a aventura e a emoção de um desafio, ao mesmo tempo que deu a possibilidade de vivenciar com muita alegria a realização de um sonho. As coisas que vi e senti ficaram para sempre em minha memória. A beleza de um mundo novo descoberto que pairou ante meus olhos não será esquecida, muito menos os aprendizados e a sensação de conquistar o desconhecido. Que venham novos caminhos para serem trilhados e, de preferência, todos eles de mochila nas costas!

Todas as fotos nesta publicação foram tiradas pelo próprio autor ou por seus amigos. Se quiser conferir mais fotos dessa viagem, visite nosso Instagram.

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Originalmente publicado no site www.folhaembranco.com.br em 17 de Setembro, 2014.

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Desde pequeno apaixonado por literatura, abraçou o sonho de se tornar escritor.